“SE PASSAR” a pandemia…
Carlos Moraes » março 2021
É quase impossível duas pessoas se encontrarem nesses dias e não tocarem no assunto Coronavírus, pandemia, vacina, e nas perdas de pessoas. Entre os pastores, pelo menos no meu caso, no fim da conversa chegamos aos questionamentos sobre como será, para as igrejas, quando a pandemia passar.
Em meio a algumas divergências pontuais, há unanimidade em um tema: Todo pastor tem trabalhado dobrado e o desgaste tem sido tremendo. Apesar de tanta inatividade e paralização, fica até engraçado quando o pastor diz que a primeira coisa que ele quer depois da pandemia é tirar férias.
Não sou de perder o sono, mas confesso que em mais de um ano nesse ritmo pandêmico, tive algumas noites de insônia. Não tanto pela preocupação com a doença em si, mas com as “doenças” que certamente surgirão quando tivermos que voltar ao ritmo da vida no pós-pandemia. Há muitas perguntas para as quais temos apenas respostas conjecturais. Ligamos o achômetro e soltamos nossas opiniões. Afinal de contas, nenhum de nossa geração viveu experiência como esta.
Outra razão que me levou a encurtar o tempo de sono confortável em algumas noites, tem a ver com as elucubrações acerca do sentimento de perda sofrido por pessoas que amamos. Pensar naquele casal amigo que foi a óbito deixando filhos ainda na adolescência; aquela viúva idosa que perdeu o marido ainda saudável, com o qual fazia planos; pensar na saudade de tantos que ainda não saíram do choque pela perda repentina, como em tempo de guerra. Além das mortes, tem aquele sentimento estranho devido à perda de recursos financeiros que deixa alguns sem saber o que fazer, tentando apenas sobreviver com o mínimo necessário para alimentos e medicamentos.
Nesse período descobrimos, de modo prático, o significado de “orar sem cessar”, pois, o tempo todo recebemos pedidos de oração e aprendemos parar e orar. Na leitura bíblica e nos momentos devocionais, parece que estamos em busca de respostas, que, quando nos chegam, não parecem muito convincentes. Tenho ouvido e vivido questionamentos sobre textos que antes pareciam consolar, encorajar, mas agora não jogam tanta luz nas trevas como antes. De certa forma eu me vejo como os amigos de Jó: Elifaz, Bildade, Zofar e Eliú que, mesmo não ficando indiferentes ao sofrimento do servo de Deus (Jó 1.8), também não sabiam o que fazer. A tragédia que se abateu sobre o amigo era tão grande, que eles combinaram ir até ele e demonstrar solidariedade e consolo (Jó 2.11), mas quando enxergaram a real dimensão do sofrimento, começaram a chorar, rasgaram as vestes, colocaram terra sobre a cabeça, assentando-se no chão com ele, e ali ficam sete dias e sete noites, sem dizer uma só palavra (Jó 12.12b-13).
O maior aprendizado que tive nesse primeiro ano de pandemia, foi o de ficar em silêncio mais tempo do que antes, e também de orar um pouco mais pelos irmãos em Cristo, pelos familiares, pelos pastores e missionários, e por muitos outros. Creio que todos nós intensificamos nosso ministério de silêncio e de intercessão. Essas novas práticas, de certa maneira, nos mantêm unidos mesmo impedidos de estar fisicamente juntos prestando culto. Transmite a ideia de que não estamos dispersos, mas apenas organizados de maneira diferente.
Á distância, todos pastoreamos e somos pastoreados por pessoas que, como nós, sentem falta de estar junto de outros para consolar, encorajar, amparar, estimular e desafiar. À distância, e sofrendo do mesmo mal, nos irmanamos nas fraquezas e na fragilidade da vida que é como um vapor. Essa maneira singular de buscar a Deus, nos faz entrar mais amiúde no quarto, em secreto, com a porta fechada para orar mais com gemidos inexprimíveis do que com palavras escolhidas. Certamente, como igreja, temos aprendido a orar para que o Senhor nos livre do mal, mas de maneira solidária, livrando aos outros também.
Obrigados ao distanciamento social, a tecnologia das redes sociais possibilitou avenidas de trânsito e pontos de encontro. O WhatsApp virou gabinete pastoral para aconselhamento, o notebook, sala de reunião, e as lives, púlpitos. Esses recursos emergenciais certamente serão suplementares quando o normal voltar.
Essa pandemia, quando passar, se tornará uma especialização ministerial para os pastores e missionários, e um aprendizado, sem igual, para todos nós que fazemos parte do Corpo de Cristo. Veremos, com certeza, que muito do que institucionalizamos foi para substituir o que a Bíblia ensina sobre ser Igreja. Poderemos redescobrir que o propósito da Igreja é alcançar o mundo evangelizando e fazendo discípulos de todas as nações. Essa pandemia, SE PASSAR, poderá ter o mesmo papel daquela primeira dispersão iniciada em Atos 8, e que se repetiu através de toda a história do povo de Deus quando houve acomodação. Maranata!
Que possamos ver essa Pandemia como uma oportunidade de falarmos da salvação, apesar do isolamento e de tantos problemas que o Covid-19 tem nos imposto. Gostei muito do seu texto, muito elucidativo nesses dia tumultuados que vivemos.